A parada agrícola em Vila Nova de Famalicão (1912)

 

Uma festa de trabalho na laboriosa Vila do Minho das mais lindas mimosas daquela região a que bem se chama Jardim de Portugal.

Era apenas uma vasta planície no centro da Província do Minho, entre as cidades do Porto e de Braga, mas tão bem disposta para agricultura e cortada por uma estrada romana, que D. Sancho I, o povoador, determinou povoá-la, dando privilégios ao povo que a fosse povoar e concedendo-lhe foral em 1 de julho do ano 1205.

Com o tempo se foi povoando e crescendo em edificações, mas o seu maior desenvolvimento data de 1841, em que a rainha D. Maria II lhe concedeu novo foral elevando a simples freguesia a Vila Nova de Famalicão.

Desde esse ano até o presente o seu desenvolvimento tem sido progressivo mercê da sua situação corográfica, da fertilidade de seu solo e da laboriosidade de seus habitantes.

Agora veio afirmar seus progressos com uma importante parada agrícola e industrial que realizou, mostrando a opulência da agricultura do seu concelho, que se estende pelas povoações de: Cruz Velha, Santo Adrião, Poço, Fornelo, Pinheirinho, Painçaes, Pereiros, Mões, Ribeira, Poido, Sinçães e Louredo de Baixo, além de quintas e casais, etc.

Essa parada, promovida pela Associação de Agricultura Famalicense e Associação Comercial Industrial, foi um triunfo do trabalho famalicense.

Nada há que mais justamente entusiasme e anime o espírito patriótico do que ver essas forças do trabalho nacional, com que se há-de regenerar e engrandecer a nossa pátria.

Não tivemos a fortuna de assistir a esta parada, mas fazemos bela ideia do que foi, por outras de que temos sido testemunha em Elvas e em Vila Franca, verdadeira ostentação da nossa riqueza agrícola, e que outra pode haver neste país de excepcional torrão fecundo e apto a todas as culturas da terra!

E, no entanto, o país tem mais de um terço de terra arável por cultivar e ainda importa pão e outros cereais para se alimentar!

O ter terras de tão boas qualidades sob um clima dócil, é possuir uma riqueza inexaurível; mas a nossa agricultura luta com dificuldades que tolhem o seu mais largo desenvolvimento, e a maior dessas dificuldades é a tributação da terra, e num país de impostos excessivos é impossível progredir.

Lutando com estes inconvenientes e ainda com a pouca vulgarização de certos processos mais modernos de cultura e de exposição, principalmente para exportações, a agricultura portuguesa progride mui lentamente, quer para o consumo interno, quer para a sua expansão externa.

Pareceram-nos úteis estas observações a propósito da festa realizada, que maior valor terá se ela conduzir a agricultura nacional ao fim prático que convém ter em vista, não nos deixando só enlevar em nossos entusiasmos meridionais e olhando antes aos progressos positivos de que há mister.

Foi notável a parada agrícola de Famalicão; mostrou muito do trabalho feito naquele laborioso concelho, que outros e mais outros lhe sigam o exemplo, e a terra portuguesa será duplamente florescente por seus dotes naturais e pelos que o trabalho de seus filhos lhes acrescentarão.

E, agora, seguindo informações que temos presente, façamos uma breve descrição do que foi o cortejo.

O primeiro, Carro da Associação da Agricultura Famalicense, com alfaias agrícolas, puxado por 5 juntas de bois, com as lindas cangas arrendadas e características da província, guiando os bois belas cachopas minhotas, que as não há mais formosas.

Segue o Carro da Associação Comercial e Industrial, tendo ao centro, sobre um obelisco a figura da Fama e à frente outra representando a Industria; caixas, fardos, barris, com as marcas de negociantes de Famalicão é quanto este carro conduz, além de crianças que distribuem reclamos.

Seguem-se mais carros pela seguinte ordem:

Carro da firma Pinto Basto, de Lisboa, de reclamo ao citrato de sódio. É lindamente decorado de pinturas e mereceu o prémio especial de medalha de ouro e diploma de honra.

Carro da Freguesia de Gondifelos, do sr. Duarte de Menezes e outros proprietários, representando a casa de um moinho com todas as pertenças, incluindo água, moleiro e jumento, tudo característico da localidade. Foi-lhe conferido o primeiro prémio da Agricultura.

Carro da tipografia de Gaspar Pinto de Sousa e Irmão, da vila, conduzindo utensílios tipográficos, inclusive uma máquina Minerva, tudo artisticamente disposto, e operários tipógrafos, animando o quadro. Teve o segundo prémio da Indústria.

Carro da Esfolhada do sr. António Gomes da Silva Brandão, interessante cena da vida dos campos. Coube-lhe o terceiro prémio da Agricultura.

Carro de Bombas de pau, reclamo aos trabalhos do artífice Manuel Rodrigues. Terceiro prémio da Indústria.

Carrro dos Castelões de reclamo aos adubos químicos, do sr. Manuel Torres. Este carro exemplificava o efeito dos adubos na terra que fazia germinar com exuberância e da terra árida e seca por não lhos aplicarem. Foi-lhe conferido o segundo prémio.

Carro de J. Rocha, de reclamo à casca de carvalho de que se faz grande exportação. Teve o quarto prémio.

Carro da Malhada, do sr. António José Barros de Faria, representando a malhada e a limpa do centeio, o qual foi premiado com segundo prémio.

Carros da Casa Portela, de Famalicão, o primeiro dos quais era de reclamo às diferentes alfaias agrícolas que fabrica, e que levava à frente uma rapariga empunhando um estandarte onde se lia Honra e Trabalho, e tendo pendente as medalhas que esta casa tem obtido em varias exposições. O segundo carro era de reclamo aos adubos químicos que a mesma casa fornece. Bem decorados estes carros, tiveram dois primeiros prémios.

Outros carros ainda se viam no cortejo, de menos importância, não obstante merecerem os prémios que lhe foram conferidos.

Houve também exposição de gados em que obtiveram prémios os seguintes expositores:

Srs. Manuel Pereira de Araújo, por belos exemplares de bois de engorda;

Duarte Maria de Menezes, por bois de trabalho;

Camilo Rodrigues de Freitas, por vacas leiteiras;

Manuel António Joaquim dos Santos, por touros.

Foi uma festa e um certamen proveitoso, de incitamento ao trabalho e ao progresso com que Vila Nova de Famalicão se honrou.

"Occidente" nº 1209 - 30 de Julho de 1912

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