Pregões de Lisboa - As leiteiras
A leiteira, em Lisboa, a pregoar o seu leite! |
Lisboa de
pregões sonora e linda,
Lisboa de pregões, linda e sonora,
Frases cantantes de saudade infinda,
Vozes que a chama da alegria cora.
Os pregões de
Lisboa - cantilena,
Notas confusas de pregões sem fim,
Alguns chorosos, trémulos de pena,
Outros vibrando em notas de clarim.
Duas simples
palavras sem enfeite
- Mas numa voz de tal suavidade! -
A adorável meiguice do «iá leite!»
Adorável de graça e de saudade.
Quem tão doce
pregão cedo apregoa
Na rua triste, quási sem ninguém?
É a varina, a leiteira de Lisboa,
De pés bem feitos, nús, pisando bem!
Como é graciosa
e linda!... E com que planta
Corre essas ruas de Lisboa inteira.
Tem raça grega - é neta da Atalanta,
Essa escultura viva, essa leiteira!
Martinho de Brederode
Fonte:
"Ilustração Portuguesa", nº381 - 1913
As leiteiras de Lisboa
No início do
século XX, as leiteiras eram figuras conhecidas e essenciais nas ruas de
Lisboa.
Mulheres
corajosas, carregando os pesados cântaros de leite fresco sobre suas cabeças,
anunciavam sua chegada com pregões que ecoavam pelas ruas estreitas da cidade.
Também podiam
fazer-se acompanhar de uma ou mais vacas leiteiras, que eram mugidas em plena
rua, pelo que o leite ia diretamente das tetas da vaca para a mesa dos lisboetas.
Era chamado o "leite perigoso", pois não era - não havia - leite
pasteurizado.
Com as suas
vozes potentes e melódicas, as leiteiras despertavam os lisboetas de suas camas
logo nas primeiras horas da manhã. Muitas vezes, era o único contato que essas
pessoas tinham com o mundo exterior antes de começarem mais um dia de trabalho
árduo.
"Olha o leitinho fresquinho que é bom e
baratinho…", era um dos pregões mais comuns. Essas mulheres sabiam
como atrair a atenção dos seus clientes com as suas frases cativantes e ritmos
contagiantes.
Além do leite,
algumas leiteiras também vendiam outros produtos como manteiga e queijo
frescos.
No entanto, não
era apenas o trabalho duro que caracterizava as leiteiras. Elas também eram
símbolos de perseverança e resiliência.
Mesmo
enfrentando condições climáticas adversas, como chuva ou sol escaldante, elas
não desistiam de cumprir seus pregões e entregar o alimento tão necessário às
famílias lisboetas.
Infelizmente,
com o avanço da industrialização e a modernização das cidades, o ofício das
leiteiras foi gradualmente desaparecendo. O leite fresco passou a ser
comercializado em embalagens, e as vendas na rua foram substituídas pelos
supermercados.
No entanto, a
memória das leiteiras permanece viva na história e na cultura de Lisboa. Os
seus pregões ressoam em velhas fotografias e nas narrativas de quem viveu na
época.
Elas foram
verdadeiras guerreiras, donas de vozes poderosas que ecoavam pelas ruas em
busca de clientes e sustento.
Assim, as
leiteiras são lembradas não apenas como mulheres que vendiam leite, mas como
símbolos de uma era passada, em que os pregões ecoavam pelas ruas de Lisboa,
anunciando a chegada do alimento essencial às mesas das famílias. (GPT)