Camponesas das margens do Mondego atravessando o rio a vau
Camponesas das margens do Mondego atravessando o rio a vauDesenho de M.de Macedo |
O rio ainda não
cobre de lés a lés os campos agora verdejantes.
Os juncos
rasteiros esmaltam aqui a ali a superfície das águas.
A veia deriva
fácil por entre as pedras e as plantas com sonoro murmúrio.
Ainda há pouco
bramante e espumante, galgava veloz e furioso por fora do leito, tornando
perigosa a navegação, agora uma criança o atravessa, e o pobre barqueiro tem
que saltar vinte vezes do barco para lhe abrir caminho com a enxada por meio da
areia, ou empurrar com o peito, não como Vénus em Mombaça para impedir que os
navios fossem avante, mas a fim de o fazer subir ou descer a corrente, tão
baixa e minguada, que apenas de corrente conserva o nome.
A ponte é
longe, as barcas de passagem também só se encontram em certos pontos, e os
aldeãos que vão ou vêm do trabalho descem à margem do rio e, como se ele fora
uma estrada, atravessam-no em qualquer direção, procurando o caminho mais
curto.
As mulheres das
aldeias fazem o mesmo. Arregaçam as saias e cruzam-nas atando-as em nó com o
que lhes dão um jeito de calças e passam a veia da água sem receio e sem
cuidado.
Que vão para o
trabalho, ou dele venham, como aquela que se vê ao longe, arremangada, com o
cesto de erva à cabeça e a sachola de crista em cima.
Que vai para a
feira ou para o mercado com o chapéu e as chinelas dentro da canastra, ou vá
levar o jantar ao marido dentro do canastrel, acompanhada da pequerrucha, gorda
e robusta de grossas contas e bentinhos no pescoço, a perna robusta e bem feita,
descoberta até quase às nádegas, e muitas vezes, se a água é mais funda, até
estas, corta a água com um certo jeito particular para que esta não salte e
salpique.
Quem discorre
pelas margens do Mondego, do Vouga, do Minho e de muitos dos nossos formosos
rios tem gozado estas cenas singelas e agradáveis, e ouvindo os gracejos que os
aldeões dirigem às cachopas bonitas quando caminham pelo rio.
Fonte:
"Occidente", nº 93 - 21 de Julho de 1881 (texto editado e adaptado)