Sobre o desaparecimento dos trajes populares portugueses
O etnólogo português Jorge Dias afirmou um dia que “(…) Nós, portugueses, estamos não nas vésperas, mas em plena fase
de perdermos toda essa riqueza do passado.
Se
não corrermos rapidamente a salvar o que resta, seremos amargamente acusados
pelos vindouros, pelo crime indesculpável de ter deixado perder o nosso património tradicional, dando mostras de absoluta incúria
e ignorância. Se não o fizermos, daqui a duas gerações podemos ser um povo
descaracterizado e profundamente pobre
(…)”
Já sobre os
trajos populares do nosso povo, Dutra
Faria, num bem redigido artigo sobre As Tradições e o Progresso, lança
este avisado conselho:
«Os trajos populares, tão diversos de
província para província, por vezes até de aldeia para aldeia, e tão ricos de
graça, cor, de pitoresco, vão desaparecendo - e não tardará muito o dia, se
depressa não se acode ao mal, em que todos os nossos campónios vistam como o
«farmer» da Califórnia ou da Irlanda, em que todas as raparigas e todas as
mulheres dos nossos montes e das nossas terras usem os mesmos chales, os mesmos
lenços e as mesmas blusas de chita que usam as camponesas da Dinamarca, da
Bélgica ou da modernizada Turquia.» (1)
E Celestino David, numa análise ao Trajo
Regional, foca igualmente esse tema, que alvoroça o nosso brio
nacionalista:
«A beleza de certos exemplares do nosso trajo
popular, do Norte ao Sul do país, da campina rasteira à montanha arrogante,
trajo de maiorais e pastores, lavradeiras e campaniças, abastarda-se dia-a-dia,
cai no esquecimento e tem-se a impressão bem penosa de que a próxima geração,
porventura, a não encontra para a bendizer e admirar.
O que fazia o encanto da minhota em dia de
festa - o seu garrido trajo à vianesa - o que era a graça da tricana coimbrã -
o pôr do lenço e o traçar do chale - assim como o que dá um certo ar ao nosso
lavrador ou à nossa managuia - calça esticada e jaleca de alamares, saia de
estamenha ou lenço de rebuço - não deve ser, em breve, assim pensam alguns,
mais do que peças de museu, se houver quem as aprecie em termos de as guardar e
não esquecer.» (1)
E, por último, Raúl do Rego, numa local epigrafada Pelos
Trajos Regionais, advoga apaixonadamente a tradição do nosso vestuário
popular:
«... a conservação dos trajos regionais em toda a sua pureza, em que muita gente se empenha, não é uma mania de reagir contra inovações, nem tão pouco se inspira num exclusivismo estreito e míope. Não é a adoração do trambolho do passado, tão querida e cultivada por aqueles que se sentem incapazes de construir um presente. O desejo de restaurar o trajo regionalista é somente o culto da harmonia; harmonia entre o clima, a paisagem, o carácter dos habitantes e a sua maneira de vestir.» (1)
(1) In “Boletim da Junta de Província da Estremadura” - 1939